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Economistas propõem “solução sustentável” para a dívida portuguesa

Economistas da Plataforma de Crescimento Sustentável, liderada por Moreira da Silva, defendem que será possível reduzir a dívida pública dos actuais 130% para menos de 100% do PIB, em 10 a 15 anos, através de uma combinação de saldos primários na ordem dos 3% do PIB com um crescimento nominal acima dos 3%. E rejeitam “soluções milagrosas” para a dívida, como um ‘haircut’ que, garantem, teria consequências “calamitosas”.
5 Junho 2017, 16h00

A Plataforma para o Crescimento Sustentável (PCS), liderada pelo social-democrata Jorge Moreira da Silva, apresentou esta segunda-feira um ‘policy paper’ em que defende que a redução da dívida pública é uma “prioridade”, mas que a mesma deve ser feita cumprindo as regras orçamentais europeias, diminuindo os ‘stocks’ da dívida, criando condições para o crescimento económico e fazendo uma gestão prudente da dívida pública, antecipando os pagamentos ao FMI e “alisando” os montantes a reembolsar todos os anos.

A existirem soluções europeias, as mesmas poderiam passar por um programa de mutualização das dívidas (“eurobonds”), que permitiria uma poupança anual de 900 milhões de euros, mas para tal será necessário cumprir as regras e entrar numa verdadeira união orçamental a nível europeu, defendem os autores do estudo.

Coordenado pelo economista e professor universitário Joaquim Miranda Sarmento, o relatório da PCS contou com as colaborações de Luís Bravo, Francisco Catalão, Nelson Coelho e Ricardo Santos. E, segundo Joaquim Miranda Sarmento, não pretende ser uma resposta ao relatório que um grupo de economistas do PS e do Bloco de Esquerda apresentou há cerca de um mês e que defende, entre outras medidas, a reestruturação dos 51,6 mil milhões de euros em empréstimos europeus recebidos por Portugal em 2011.

“Este trabalho começou a ser feito em outubro ou novembro do ano passado. (…) O que quisemos foi apresentar uma proposta nossa que nos permitisse ter um debate mais informado e rigoroso sobre esta matéria. (…) Tínhamos o relatório pronto em Abril mas entretanto saiu o do PS e do Bloco e quisemos dar algum tempo”, explicou Joaquim Miranda Sarmento.

Os autores rejeitam “soluções milagrosas” para a dívida pública, como um perdão [‘haircut’], as quais, defendem, teriam “custos económicos e sociais muito elevados” e “consequências calamitosas”. A PCS defende que será possível reduzir a dívida pública dos actuais 130% para menos de 100% do PIB, em 10 a 15 anos, através de uma combinação de saldos primários na ordem dos 3% do PIB com um crescimento nominal da economia acima dos 3%.

A PCS sugere ainda que o IGCP deve procurar diversificar as fontes de financiamento, alisar os montantes de dívida a reembolsar anualmente para menos de 10 mil milhões de euros por ano e manter uma almofada de liquidez na ordem dos 6 a 8 mil milhões de euros, como forma de evitar o recurso ao mercado em situações de turbulência.

“O facto de estarmos num momento positivo não nos deve fazer esquecer que a situação internacional é muito volátil”, disse Jorge Moreira da Silva, fundador e presidente da PCS, num encontro com jornalistas que teve lugar esta manhã. Moreira da Silva e os autores do estudo manifestam-se contra a redução desta almofada, ainda que a sua manutenção represente um custo para o Estado português.

Haircut teria consequências “calamitosas”

“Uma solução com ‘haircut’ não seria impossível [de fazer] mas teria custos elevadíssimos, extraordinários, para Portugal”, defendeu Joaquim Miranda Sarmento. “Uma grande parte da dívida pública está em mãos nacionais [ver dados abaixo] – na poupança dos portugueses e no sector financeiro – e qualquer solução de haircut teria um impacto muito negativo”, defendeu. “Qualquer solução tem de partir do cumprimento das regras orçamentais europeias”, acrescentou. O economista defende que não será possível negociar uma eventual “solução europeia” para a dívida pública sem que essas regras sejam cumpridas.

 

As soluções propostas pela Plataforma para o Crescimento Sustentável:

As soluções propostas pela PCS dividem-se em duas componentes. Em primeiro lugar, as que estão ao alcance de Portugal através de uma gestão “prudente” da dívida pública. Em segundo lugar, as soluções europeias.

 

– Gestão da dívida pública:

  1. Diversificação: A PCS defende que a nível da gestão da dívida pública a solução deve passar por continuar a diversificar as opções de financiamento da República, através de novos instrumentos para investidores de retalho e tornando os actuais produtos, como os certificados de aforro, “cada vez mais atractivos em termos de rentabilidades, maturidades e risco”.
  2. Alisar montantes a reembolsar anualmente: A PCS defende que o IGCP deve procurar “alisar” os montantes de reembolso de dívida de médio e longo prazo para um valor abaixo dos 10 mil milhões de euros, em torno dos 5 a 6 mil milhões de euros ao ano. “Um montante desta ordem de grandeza seria perfeitamente gerível”, defendem os autores do estudo.
  3. Reforçar os reembolsos antecipados ao FMI e manter almofada de liquidez: Os reembolsos ao FMI são uma importante fatia dos “picos” de reembolso da dívida que terão lugar em 2020 e 2021 (ver imagem abaixo). A PCS defende, por isso, que o reembolso ao FMI deve ser antecipado, para alisar os montantes a reembolsar. “Hoje há um consenso bastante alargado quanto à ideia de pagar ao FMI o mais depressa possível”, disse Jorge Moreira da Silva”. “Primeiro o FMI e depois a recompra de dívida em mercado”, disse por sua vez João Moreira Rato. “Quando as condições de mercado permitirem emitir com prazos mais longos [10 a 15 anos] faz sentido aproveitar as oportunidades de mercado para emitir mais longo, para uma gestão prudente do risco”, acrescentou, defendendo que dessa forma teremos mais segurança a médio e longo prazo.

 

– Soluções europeias: 

O grupo de trabalho considera que, a nível europeu, “só é possível procurar soluções que não passem por restruturação com haircut ou outro tipo de perdas para os Instrumentos Europeus”, dado que qualquer perda sofrida por estes instrumentos teria de ser suportada pelos contribuintes dos estados-membros da zona euro. “Tal afigura-se impraticável do ponto de vista político”, defendem.

Assim, as medidas “europeias” propostas pela PCS têm em conta esse condicionamento político:

  1. ESM compraria as OT que estão no Eurosistema: Esta solução significaria que o ESM iria substituir o BCE e os bancos centrais nacionais, comprando a dívida pública detida por estas entidades. Dessa forma, esta solução como vantagem o mecanismo europeu poder refinanciar estes títulos na maturidade, defendem. Em contrapartida, o ESM necessitaria de um aumento de capital para poder manter o seu rating. Seria também necessário o OK dos restantes estados-membros.
  2. ESM passaria a ter uma linha cautelar para as emissões dos próximos 4 a 5 anos: Esta solução colocaria Portugal sob proteção do ESM, o que significa que poderiam existir avaliações trimestrais para o cumprimento dos tratados orçamentais. O país ficaria automaticamente qualificado para as compras de dívida do BCE, mas em contrapartida teria de existir um acompanhamento apertado por parte de Bruxelas.
  3. Eurobonds até 60% do PIB, com poupança anual de 900 milhões de euros: A PCS considera que esta seria a melhor solução e a mais justa para Portugal e para a Europa, com uma poupança anual na ordem dos 900 milhões de euros mas só será possível com uma verdadeira união orçamental e um tesouro europeu, defendem os economistas da Plataforma. “Estando concluída a construção do fiscal compact e a definição de um maior controlo, por parte da Comissão Europeia, não só sobre a política orçamental, mas também sobre os desequilíbrios externos, está agora em falta a outra parte do “acordo”: a partilha da responsabilidade da dívida pública”, referem os economistas da PCS. No entanto, advertem, essa “mutualização só é justa e aceitável pelos Estados-membros do norte da Europa se os países forem cumprindo os seus compromissos do Pacto Orçamental, ou seja, não apenas os objetivos para o défice, mas também para a redução da dívida”. A PCS estima o benefício de Portugal com esta solução em 0,5% do PIB, graças a uma redução da taxa de juro implícita de 0,4 p.p.. Além desta poupança em juros, acrescentam, Portugal poderia beneficiar de um aumento da maturidade média, passando de 8 para 12 anos. “Assim, esta solução contribuiria para melhorar a sustentabilidade da dívida sem implicar qualquer tipo de problemas ao financiamento em mercado nem perdas para investidores (nacionais ou internacionais)”, acrescentou.

 

 QUEM DETÉM A DÍVIDA PÚBLICA PORTUGUESA:

(Valores em milhões de euros)

Institucionais sem possibilidade de ‘haircut’:

FMI: 16.500

BCE/BdP: 34.000

Investidores nacionais:

Particulares: 25.000

Sistema financeiro português: 53.500

Segurança Social: cerca de 8.000

Outros Investidores:

Instrumentos Europeus: 51.600

Investidores Estrangeiros: 51.500

 

Para consultar o estudo na íntegra clique aqui.

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