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Justiça investiga créditos da Caixa aos Espírito Santo

Justiça já está a ver à lupa os créditos problemáticos concedidos pelo banco do Estado. Na mira dos investigadores estão mais de 300 milhões de euros de financiamentos ao GES.
13 Abril 2017, 07h50

O Ministério Público (MP) já tem na sua posse a lista dos maiores créditos concedidos pela Caixa Geral de Depósitos (CGD) e que estão em situação de incumprimento, no âmbito do inquérito que investiga suspeitas de gestão danosa relacionada com a concessão de mais de 2,3 mil milhões de euros pelo banco do Estado.

A informação foi disponibilizada ainda quando António Domingues liderava a instituição financeira, antes do início de funções de Paulo Macedo, a 1 de Fevereiro. Na mira da Justiça estão empréstimos ao Grupo Espírito Santo (GES) realizados pela CGD, revelou ao Jornal Económico fonte judicial.

Na base do pedido do Ministério Público, estão os maiores créditos em incumprimento, contabilizados por devedor, com respetivos montantes, datas de aprovação, imparidades, reestruturações, garantias concedidas e planos de recuperação dos créditos em causa.

A Justiça quer também saber quem decidiu os créditos e sucessivas renovações ou reestruturações. O Jornal Económico questionou a Procuradoria-geral da República (PGR) sobre o pedido/recepção desta lista de devedores, que deverá ascender a uma centena, mas fonte oficial não fez comentários, alegando que “o inquérito encontra-se em segredo de justiça”.

Também o banco do Estado foi questionado sobre o envio da lista dos maiores devedores à justiça, tendo fonte oficial avançado que “a CGD está impedida de prestar os esclarecimentos solicitados, uma vez que os mesmos estão abrangidos pelo dever de segredo a que a instituição está legalmente vinculada”.

Fonte judicial garante, porém, que nos milhões em risco sob investigação, estão créditos superiores a 300 milhões de euros concedidos pela CGD ao GES. Em causa estão empréstimos à Herdade da Comporta e à Espírito Santo International (ESI), tendo o banco do Estado recebido como garantia imobiliário e acções do Espírito Santo Financial Group (ESFG) – a holding financeira através da qual a família Espírito Santo era a maior acionista do BES e que entrou em insolvência após o colapso do banco.

Recorde-se que a CGD é o maior credor da Herdade da Comporta, com um crédito de 106 milhões de euros. Os ativos da Comporta estão avaliados em cerca de 420 milhões de euros e o crédito do banco do Estado, concedido quando Ricardo Salgado liderava o GES, tem garantias no valor de 256 milhões de euros. Depois de uma tentativa falhada, em abril de 2015, o processo de alienação da Herdade da Comporta recomeçou em setembro do ano passado, através do Fundo Especial de Investimento Imobiliário Fechado, entidade que gere os projetos turísticos e imobiliários daquele empreendimento. A venda foi lançada com o acordo das autoridades judiciais portuguesas, que aceitaram a venda de bens do GES desde que as receitas fiquem na posse da justiça portuguesa. As propostas para a posição de 57% que a Rioforte tem no fundo teriam de ser entregues até novembro, desconhecendo-se ainda a conclusão deste processo.

Após a resolução do BES, em agosto de 2014, a CGD reconheceu no relatório e contas desse ano “significativos custos com imparidades associadas à exposição ao Grupo Espírito Santo”, não tendo, no entanto, detalhado montantes.
A CGD possui 2,3 mil milhões de euros em risco por empréstimos concedidos com garantias frágeis, segundo uma auditoria realizada em agosto de 2015, tendo o banco registado imparidades ou perdas de valor dos activos de 3.000 milhões de euros no ano passado. Só as imparidades registadas nos nove maiores devedores da CGD chegam aos 912 milhões de euros. Entre os maiores devedores estão os grupos grupo Artlant, Espírito Santo, Lena e Efacec (ver informação nestas páginas).

Ministério Público chama PJ à investigação
O Jornal Económico revelou a 16 de dezembro que o MP delegou competências na Polícia Judiciária (PJ) para a investigação criminal à CGD. Em causa estão suspeitas de gestão danosa desde o ano 2000, num inquérito dirigido pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), que investiga os crimes económicos e financeiros de maior complexidade.
A participação da PJ na investigação à Caixa resulta de um despacho genérico do MP que foi remetido em novembro do ano passado a este órgão de polícia criminal que tem competência reservada para a investigação relativamente aos crimes de catálogo.

Nos termos da Lei de Organização da Investigação Criminal, a PJ tem competência reservada para investigar crimes económico-financeiros, bem como de administração danosa, tráfico de influência, corrupção, peculato e participação económica em negócio. Nas mãos da Unidade Nacional de Combate à Corrupção (UNCC) da PJ estão agora as diligências e investigações à CGD, ainda que o DCIAP continue deter a direção do inquérito, atuando este órgão da polícia criminal sob a sua orientação e na sua dependência funcional, relativamente ao processo.

O período em investigação, entre 2000 e 2015, abrange quatro administrações da Caixa, lideradas por António de Sousa (entre 2000 e 2004), Luís Mira Amaral (entre abril e setembro de 2004 no modelo de presidência bicéfala), Vítor Martins (entre 2004 e 2005), Carlos Santos Ferreira (fez um mandato entre 2005 e 2008), Fernando Faria de Oliveira (entre 2008 e 2011, altura em que saiu para a Associação Portuguesa de Bancos) e José de Matos (completou dois mandatos: 2011 a 2013 e de 2013 a 2015). Mas as suspeitas incidem sobretudo sobre atos de gestão relacionados com créditos concedidos durante 2005 e 2010, os anos dos governos liderados por José Sócrates.

A investigação foi tornada pública a 23 de setembro, depois de a PGR ter enviado um ofício à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à recapitalização e gestão da CGD, que terá dado entrada na Assembleia da República a 15 de setembro, comunicando “a investigação do eventual crime de administração danosa”.

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