A política, mais do que tensão dialética e ambição de poder, deve ser fonte de pensamento permanente sobre a organização social. Se a sociologia estuda e analisa criticamente o fenómeno social, a política deve dedicar-se à intervenção e acção sobre este. Há uma obrigação pendente sobre o político que impele a que aja influenciando o curso dos acontecimentos, em vez de se constituir como um reactivo de oportunidade. Neste sentido, antecipar cenários e preconizar respostas é uma obrigação dos actores políticos.

O mundo em que vivemos, designado geográfica, política e socialmente por Ocidental, tem sido o espaço do encontro equilibrado entre direitos, liberdades e garantias. A busca da justiça social sob o primado da lei, guiou esta sociedade ao longo dos últimos 73 anos. Contudo, não será um choque para ninguém a constatação de que se vem perdendo fôlego nesta caminhada. As desigualdades sociais voltaram a crescer com base na disparidade de rendimentos, de acesso à educação, de mecanismos de nivelamento de oportunidades. O progresso, tão desejável, traz conforto e bem-estar, mas cria questões complexas quanto ao emprego e organização do trabalho, ambas ligadas à concentração e distribuição de riqueza.

Já disse por várias vezes que o grande momento da governação de António Guterres foi a criação do Rendimento Mínimo Garantido. Não duvido por um segundo da intencionalidade séria da sua ideia, nem tão-pouco da sua absoluta pertinência social. Infelizmente, como sempre, a máquina socialista foi exímia em transformar um conceito excelente num mecanismo perverso de multiplicação de votos e de convite de dependência passiva do cidadão face ao Estado. Nada como os piores vícios da acomodação ao poder para arruinar uma excelente ideia.

A garantia de um rendimento a cada cidadão, que assegure a sua dignidade, é um caminho inexorável, se queremos a sobrevivência do Ocidente que conhecemos e nos orgulha. Este seguro de dignidade individual é garantia de paz, de segurança e também de progresso económico e social. O caminho da evolução tecnológica obriga a uma regulamentação da distribuição da riqueza que, respeitanto o pioneirismo e o investimento, não esqueça os novos desalojados do progresso. Mas, o que fazer? Pôr o Estado a redistribuir a riqueza criada por uma legião de desocupados dependentes? Nada mais errado.

A par deste seguro de dignidade individual, deverá sempre ocorrer uma aposta fortíssima em educação e formação de qualidade. Deverá ser valorizado e bem estruturado o trabalho socialmente útil; a ocupação destas pessoas nunca poderá aparecer como um castigo, mas como uma oportunidade, uma promoção. Deverá ser estimulado e apoiado o empreendedorismo pessoal, patrocinando projectos de vida que acrescentem em termos individuais e de grupo. Deverá haver sempre um sentido de transitoriedade nesta circunstância que, em todo o caso, é de direito e não de dependência. Deverá ocorrer a todo o tempo o exercício do difícil equílibrio entre a valorização do trabalho e a não estigmatização de quem o não tem.

Num outro plano, sabemos que o tecido social é composto de indivíduos diferentes entre si. Não podemos ignorar que haverá sempre quem não queira fazer parte deste movimento positivo, que não veja um mal na dependência; não será socialmente tão útil e participativo, mas não deve ser apoucado na sua dignidade, nem empurrado para as margens. Recordemos que a busca da homogeneidade social deu os resultados conhecidos nos fascismos, no comunismo e no nazismo.

A harmonia social tem custos que devem ser assumidos sem fatalismo, mas com coragem política e realismo. Uma sociedade justa e equilibrada nunca se poderá permitir a deixar os mais frágeis para trás, sejam os que sofrem de algum tipo de limitação, sejam os que não se adaptam facilmente à mudança, sejam os que pura e simplesmente não são tão activos e empenhados. O mundo não pára. As novas realidades suscitam grandes questões a que os políticos terão de responder. Quem acredita num Ocidente de paz e progresso, e não renuncia ao princípio de que a paz é a tranquilidade na ordem justa, não pode deixar de procurar respostas às grandes questões.

A direita, enquanto humanista e defensora intransigente da dignidade do Homem, deverá concentrar-se precisamente no serviço ao Homem do presente e rumo ao futuro. Este é um debate que já está aberto e que a realidade não deixará fechar. É um debate em que a visão democrata-cristã do mundo, a par da Doutrina Social da Igreja, tem um papel fundamental e fundacional. Deixar a esquerda materialista, colectivista e estatista liderar este debate e este processo seria o pior serviço que a direita prestaria à sociedade, e uma perigosa manifestação de inutilidade. Como dizia S. João Paulo II: não tenhais medo!

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.